melhorar a educação do Brasil em 2024

A história da educação brasileira tem suas marcas por um percurso de avanços e retrocessos, em parte pelo modo como muitas iniciativas positivas não receberam a continuidade adequada pelos governos de cada período, o que nos leva a um constante retorno ao ponto de partida.

Nesse processo, a sensação que fica é que poderíamos, enquanto sociedade, estar em uma posição muito melhor se a educação fosse compreendida como uma prioridade.

Como rápidos exemplos, podemos lembrar do Plano Nacional de Alfabetização, elaborado por Paulo Freire e oficializado em 1964, mas encerrado, menos de três meses depois, por causa do golpe militar.

Podemos recordar ainda, já nos anos 1980, dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), projeto educacional inovador na cidade do Rio de Janeiro, fruto das perspectivas pedagógicas de Darcy Ribeiro, que tinha como objetivo ofertar educação pública de qualidade em horário integral.

Mas, com o passar do tempo e as mudanças de governo, acabou sendo sucateado e tendo suas principais ações descontinuadas.

Mais recentemente, podemos lembrar da queda de investimentos em educação, que atingiu o pior patamar dos últimos dez anos, os problemas de gestão em torno do ENEM, com a menor número de inscritos desde 2005[1], ou ainda o corte dos recursos para as universidades federais, que caiu 45% nos últimos quatro anos.[2]

Por que não parece que melhora?

Podemos, enfim, repassar inúmeras ações importantes a favor da educação brasileira encerradas ou enfraquecidas; mas, partindo dessa breve reflexão sobre os descaminhos que nos trouxeram até o atual contexto sócio-histórico em que estamos, devemos pensar em nosso momento presente e nas expectativas que o cercam.

Cabe, neste momento, refletirmos sobre quais iniciativas contribuiriam para a melhora da educação brasileira.

A lista de ações seria muito extensa, já que, como bem sabemos, não são poucos os problemas que carecem de solução. Por isso, no breve espaço deste texto, veremos três pontos que, independentemente, da gestão responsável, não podem ficar de lado, sob pena de não superarmos desafios atuais e também históricos que permeiam nossa educação.

Três pontos cruciais de atenção

Pandemia e seus efeitos colaterais

O primeiro ponto que considero incontornável é a atuação nos efeitos colaterais da pandemia na educação do país.

Devido a carência econômica da maior parte da população brasileira, muitos jovens não puderam acompanhar com qualidade as aulas online ou estudar adequadamente com os materiais fornecidos pelas redes de ensino.

Além disso, há também os fatores sociais e emocionais bastante afetados, uma vez que os alunos precisaram ficar praticamente dois anos distantes da interação presencial com seus colegas e professores, o que igualmente prejudicou a aprendizagem de uma grande parcela de estudantes.

Pesquisas recentes já têm se debruçado sobre o impacto dos efeitos pandêmicos na educação, principalmente entre os mais jovens.

Segundo dados da Pnad Contínua presentes em estudo elaborado pela Unicef, “A proporção de crianças brasileiras de 7 a 9 anos que não sabem ler ou escrever dobrou entre 2019 e 2022 no país.

Naquele ano, 20% das crianças de 7 anos eram analfabetas. Em 2022, após dois anos de pandemia e de acesso restrito a aulas regulares, o percentual escalou para 40%”.[3]

Logo, se pensamos em ações que podem melhorar a educação brasileira, devemos pensar em estratégias que deem o suporte necessário aos estudantes afetados pelo longo tempo longe da escola.

Se por um lado é notório que essas iniciativas deveriam fazer parte de uma política pública educacional, por outro, temos que ter clareza da urgência dessa situação e buscar, no cotidiano escolar, nossos próprios caminhos.

É possível pensar um planejamento unificado, que parta da avaliação diagnóstica dos alunos para, só então, estabelecer quais conteúdos devem ser priorizados em cada disciplina, ao invés de partimos do molde curricular pré-pandemia, como se nenhuma reorganização precisasse ser feita.

A primeira escolaridade

Outro ponto de inquestionável importância é a situação dos primeiros anos de escolaridade. Esse tópico dialoga com o anterior, pois, como vimos, em situações de crise, os elos mais frágeis são os que mais sofrem.

Embora tenhamos tido na história da educação brasileira iniciativas pontuais desenvolvidas para o início da Educação Básica, ainda carecemos de ações continuadas e direcionadas para diversos aspectos em torno dessa etapa, como, por exemplo:

  1. ampliação de vagas em creches e pré-escolas;
  2. e melhoria da estrutura física desses locais, investimento na formação inicial e continuada das professoras e professores dos anos iniciais e valorização do plano de carreiras dos profissionais que atuam nesse segmento.

Aliás, sabemos que a qualidade nas etapas iniciais da educação básica, além de contribuir para que o aluno tenha uma melhor trajetória escolar, se reflete, também, na rotina dos familiares.

Quando o pai e a mãe conseguem colocar seu filho na creche e sabem que ele está sendo bem acompanhado, ou quando sabem que seu filho está em segurança na escola, com alimentação adequada e ensino de qualidade, eles podem se dedicar com mais tranquilidade à vida profissional, o que acarreta melhor qualidade de vida para toda a família.

Portanto, investir nos primeiros anos da educação básica não é apenas desenvolver um projeto de alfabetização para acelerar a formação de alunos, é ter sensibilidade e entender a necessidade de empenho do poder público nessa fase tão importante na vida de milhares de jovens brasileiros.

Atenção aos anos finais

Se anteriormente foi comentada a importância de uma atenção maior para os primeiros anos escolares, por último, vale destacar a igual necessidade de atenção dos anos finais da educação básica.

O Ensino Médio costuma concentrar o maior número de evasão escolar, em parte pelas demandas profissionais que passam a ser exigidas de alunos mais velhos, principalmente aqueles de classes populares.

Há também o desinteresse por uma grade curricular extensa que costuma não dialogar com a realidade do aluno e seus interesses.

Dentre os caminhos para incentivar a permanência e dedicação dos alunos desse segmento, temos, além da garantia de auxílio-estudantil (o que evita que precisem abandonar os estudos para se dedicar a um emprego), a promoção de um diálogo mais estreito entre essa etapa da escolaridade, o ensino superior e o mercado de trabalho.

O aluno deveria concluir seus estudos sabendo com mais clareza quais são suas opções futuras, caso queira cursar uma faculdade e seguir determinada carreira profissional.  

Esse diálogo, em algum momento, passaria por uma reformulação curricular que, verdadeiramente, consideraria os envolvidos no processo educacional, ao invés de impor modelos pouco condizentes com as realidades afetadas.

Os três pontos interligados e outros nós a desatar

Os três pontos comentados tratam de situações específicas vinculadas a aprendizagem dos alunos, mas, é claro, que nenhum deles terá pleno sucesso se não houver atenção para a adequada formação inicial dos professores, o que significa falar em investimento nas universidades, com ampliação das vagas, além da ampliação e reajuste das bolsas-auxílio, para que os universitários consigam concluir sua formação de maneira adequada.

Ainda assim, por melhor que seja a formação inicial, é preciso manter o professor motivado para que, ao longo dos anos, ele possa se atualizar, contribuindo da melhor maneira possível para a formação do aluno.

Tal motivação não ocorre sem a devida valorização do magistério, com bons planos de carreira, salário justo e condições de trabalho dignas.

Conclusão

Concluímos, então, percebendo que muitos pontos em torno da qualidade da educação brasileira estão interligados. Puxamos um fio e logo outro aparece e mais outro e, quando notamos, estamos tratando de múltiplas questões em torno do mesmo problema.  

Tudo isso só evidencia que a melhora da educação nacional é um tema complexo e desafiador que exige mais do que boas intenções, exige vontade política para que a educação seja tratada com o respeito e seriedade que merece; do contrário, como vimos, estaremos fadados a sempre retornar ao mesmo ponto, avançando pouco e retrocedendo cada vez mais.

[1] https://www.poder360.com.br/brasil/inscritos-e-gastos-com-enem-despencam-sob-bolsonaro-e-pandemia/ Acesso em 18.10.2023

[2] https://revistagalileu.globo.com/sociedade/educacao/noticia/2022/10/verba-para-custeio-de-universidades-federais-caiu-45percent-no-governo-bolsonaro.ghtml Acesso em 18.10.2023

[3] https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2023/10/analfabetismo-de-criancas-de-7-a-9-anos-dobra-no-brasil-apos-pandemia-aponta-unicef.shtml Acesso em 18.10.2023

Referências

Inscritos e gastos com Enem despencam sob Bolsonaro e pandemia Fonte: https://www.poder360.com.br/brasil/inscritos-e-gastos-com-enem-despencam-sob-bolsonaro-e-pandemia/  Acesso em 18.10.2023

Verba para custeio de universidades federais caiu 45% no governo Bolsonaro Fonte: https://revistagalileu.globo.com/sociedade/educacao/noticia/2022/10/verba-para-custeio-de-universidades-federais-caiu-45percent-no-governo-bolsonaro.ghtml Acesso em 18.10.2023

Decreto nº 9.465, de 2 de janeiro de 2019. Fonte: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/57633286 Acesso em 18.10.2023

Analfabetismo de crianças de 7 a 9 anos dobra no Brasil após pandemia, aponta Unicef in Folha de S. Paulo. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2023/10/analfabetismo-de-criancas-de-7-a-9-anos-dobra-no-brasil-apos-pandemia-aponta-unicef.shtml. Acesso em 18.10.2023