Como professor e formador, faz realmente diferença que tipo de formação e os ideais que o(s) egresso(s) tem(terão) ao deixar a Universidade? Essa pergunta é importante visto que, nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs), emanadas do Ministério da Educação, esse elemento é indicado como essencial dentro dos processos formativos.

Costuma-se dizer que o ponto central é a formação do cidadão e, depois, do profissional. Qualquer que seja a sua posição, algo que talvez você não saiba é que a ideia de uma formação de qualidade não é nova na educação brasileira.

Um educador central nessa discussão é Anísio Teixeira (1900-1971). Anísio era advogado de formação. Porém, suas atividades o encaminharam para a área educacional, área esta que, por sinal, ele deu contribuições vitais.

As ideias de universalidade e gratuidade da escola eram bandeiras de Anísio Teixeira, no entanto não somente dele. O próprio ideal positivista republicano de ordem e progresso eram palavras-chave que se fundiam com universalidade e gratuidade. Era uma utopia? Sim, mas uma utopia realizável e digna de ser desenvolvida.

Educação para aceitar as diferenças

  Anísio era um sonhador: pensava em educação como um processo capaz de restaurar e quebrar as diferenças tão impregnadas na sociedade de seu tempo e, envolvido no pragmatismo deweyano, achava que a escola poderia ser este instrumento. Idealizava a educação e a escola em pelo menos cinco aspectos:

  1. A educação é um direito: a educação era um bem que não poderia ser negado, fazendo parte da formação do ser humano, de fato, um direito;
  2. A educação não é um privilégio: para Anísio, era dever do governo, segundo ele, “dever democrático, dever constitucional, dever imprescritível”, a oferta de uma educação de qualidade;
  3. A educação de base deve ser geral e humanista: para Anísio, a educação envolvia a participação da sociedade e dos movimentos que nela ocorrem nos espaços de criação e consolidação da cultura, daí a necessidade de ser geral;
  4. A escola pública é a máquina que prepara a democracia: Anísio vê a escola como mecanismo necessário, porém reconhece os problemas existentes na máquina ‘ideal’ em vista do ‘real’;
  5. O professor tem de ser capacitado democraticamente: a formação do docente e sua constante (re)capacitação é visto como algo vital, onde ele indicava que: “O magistério constitui uma das profissões em que a formação nunca se encerra, devendo o professor, terminado o curso regular, continuar (…) o seu desenvolvimento… (TEIXEIRA, Anísio. Curso, estágio e seminário para formação do professor. Entrevista. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 20 abr.1958)

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Os ideais da educação e as Diretrizes Curriculares Nacionais

Esses eram alguns dos muitos ideais que tanto fizeram de Anísio um educador admirado, pois foi o representante de um movimento por meio do qual as lideranças políticas executivas procuraram estabelecer a ponte entre ciência e política.

Segundo Xavier, em estudo intitulado “Reformar a escola, modernizar a cultura: Anísio Teixeira e a Educação Republicana”:

[Abriu-se] espaço para a participação dos intelectuais na burocracia estatal, estabelecendo o comprometimento deles com as formulações da esfera política e, ao mesmo tempo, condicionando a legitimação da política à validação dos cientistas (XAVIER, Libânia Nacif. Reformar a escola, modernizar a cultura: Anísio Teixeira e a Educação Republicana in PORTO JR, Gilson e CUNHA, José Luiz (Orgs.) Anísio Teixeira e a Escola Pública. Pelotas, RS: Editora da UFPel, 2000, 39-57).

A relação discente-docente

Um elemento formativo destacado era a mediação de conhecimento e a relação discente-docente e as percepções quanto a esta temática. O corpo discente clama pela proximidade e profundidade com o saber e a aplicabilidade deste em sua realidade social. Faz-se mister relembrar que já Anísio apontava esta situação. Em seu livro Ensino superior no Brasil: análise e interpretação de sua evolução até 1969, deixava claro as dificuldades que ainda hoje são motivo de queixa e revolta entre os discentes: “Entre professor e aluno há um gentleman’s agreement de que nada pode perguntar que não tenha ensinado, significando ensinado que tenha dito em aula. Esta é, na maior parte dos casos, a função docente e o modo de exercê-la.”

Pacto da mediocridade

Anísio foi ao cerne da questão: alunos calados, ou melhor, amordaçados pela exigência ou gentleman’s agreement. Este “acordo de cavalheiro” entre professor e aluno era chamado ‘nos corredores’ universitários, quando estava na formação inicial, de “pacto da mediocridade”. Professores ensinam – ou tentam, pois muitas vezes ficam apenas na superfície – e alunos fingem que aprendem, ou pelo menos tentam.

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Conclusão

Superamos essa situação? Arrisco a dizer que ela continua cada vez mais atual na pauta da educação brasileira. Esse é apenas um exemplo, dos diversos que encontramos na obra de Anísio Teixeira. Convido você a conhecer um pouco mais…

Gilson Pôrto

Doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Universidade Federal da Bahia, mestre em Educação pela UnB, professor e pesquisador pela Universidade Federal do Tocantins. É também Investigador Colaborador do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20) da Universidade de Coimbra (UC-Portugal).