importância estudante conhecer o mercado de trabalho

Por que é tão importante conhecer o mercado de trabalho? Sou graduada em Comunicação Social Jornalismo pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), há exatos 21 anos.

Apesar das duas décadas passadas, lembro com exatidão das primeiras perguntas dos professores – “Por que escolheu jornalismo?” –, bem como das respostas dos novos estudantes – “Porque sempre gostei de ler e escrever”.

Mesmo quatro anos após esses primeiros diálogos, o conhecimento dos recém-formados a respeito do que significavam, exatamente, os propósitos e a rotina de atuação na profissão que tinham escolhido não deixava de ser algo um tanto vago e teórico.

Conceitos, dogmas, teorias, simbologia da comunicação estavam prontos a serem desfiados prontamente pelos mais diligentes e dedicados estudantes.

Como funcionavam, na prática, as redações de TV, rádio ou jornal, além das assessorias de imprensa ou de comunicação interna das empresas, entretanto, era um conhecimento detido apenas pelos que engatinhavam nos primeiros estágios, ao final do curso.

Muitos se decepcionaram ao ingressar no mercado de trabalho? Dezenas! Outros tantos pensaram em mudar de ramo? Muitos. Quantos não perceberam estarem despreparados para a vida prática da profissão? A grande maioria.

O impacto de lidar com uma rotina imprevista durante os anos de faculdade não é exclusividade do meio jornalístico.

E, embora muito tenha se tornado possível de ser previsto atualmente, devido à facilidade de exploração dos mais diversos universos com o advento da internet, muitos recém-formados ainda ingressam no mercado de trabalho sem conhecer exatamente sua dinâmica, sempre em mutação.

Qual a importância de deter esse conhecimento, antes mesmo do preenchimento dos formulários de inscrição nos vestibulares ou seriados e da matrícula nas instituições de ensino? Testes vocacionais realmente funcionam? 

A escolha da profissão é a última etapa de um processo 

Atenção e envolvimento são imprescindíveis para as escolhas profissionais, que devem acontecer de forma madura e após a mitigação, com o devido tempo e sem pressa, de todas as possíveis dúvidas a respeito.

Nesse processo, é importante considerar algumas questões que podem ter utilidade na aproximação do universo de trabalho das mais variadas carreiras, além de auxiliar na busca por mais segurança quanto a essa decisão.

Autoconhecimento é o primeiro passo. A partir do momento em que o estudante admite, sinceramente, suas habilidades e afinidades pessoais, bem como inabilidades, já começa a ter um pouco delineada a área na qual deverá ingressar.

Para alguém que possui facilidade para executar determinadas atividades, ter estas tarefas que lhe aprazem ou lhe são mais fáceis no dia a dia da profissão significa mais compatibilidade. Consequentemente, mais rendimento nos resultados.

Ana Cantarelli, especialista em Gestão de Pessoas e membro da Federação Brasileira de Gente e Gestão, afirma que tem percebido mais recentemente, olhando para o mercado e ouvindo pessoas, que quem consegue realizar algo que gosta tem naturalmente maior probabilidade de fazer aquilo acontecer de forma mais efetiva.

“Ou seja, converte aquela ação em remuneração ou retorno financeiro. Tenho dificuldade em ver, na prática, uma pessoa que passe muito tempo fazendo aquilo que não tenha ‘habilidade natural’, não goste ou não se identifique conseguindo retorno financeiro. Isto não é saudável mental e, às vezes, até fisicamente”, aborda.

É preciso, entretanto, ter também em mente que habilidades podem ser desenvolvidas. Sentir dificuldade em fazer algo não é impedimento para seguir determinada carreira na qual ele é imprescindível. “É preciso ter um olhar cuidadoso para esta dobradinha de habilidades e afinidades pessoais.

Algumas possibilidades são parte do seu talento, lhe serão naturais. Elas lhe trarão, naturalmente, mais facilidade para executar algumas coisas, mas haverá muitas outras que todos poderão aprender. Existem habilidades que serão suas e outras que precisará desenvolver ao longo da vida para poder fazer este movimento”, sugere Ana Cantarelli.

Conhecer o mercado de trabalho e possibilidades de atuação

Embora seja ponto de partida para as escolhas profissionais, as aptidões, habilidades e gostos pessoais nem sempre convergem com a rotina da profissão a que mais se adaptam. É preciso, portanto, avaliar também as oportunidades disponíveis no mercado de trabalho.

Nesse quesito, não se pode deixar de buscar informações a respeito de atuações (emprego formal, trabalho autônomo, carreira acadêmica, concurso público etc), ambiente de trabalho; perfil de profissional buscado pelas empresas; faixa salarial; chances de crescimento, etc.

Conversar com profissionais da área também é algo essencial para descobrir algo que talvez não seja tão simples de se perceber por meio de pesquisas: os desafios das profissões.

A partir daí, é possível avaliar se há disposição para lidar com situações que possam surgir e até já se preparar para superá-las no futuro. Lembrando, sempre, das dificuldades em tentar prever esse provir e de que ele está sempre muito mais próximo do que se imagina.

Ana Paula Muhlert, psicóloga clínica, lembra que depois da pandemia, por exemplo, as pessoas precisaram se reinventar. Então, o mercado está expandindo. “Atualmente, as habilidades que o mercado mais pede e avalia nas avaliações de perfis é a criatividade, pensamento crítico, liderança, resolução de problemas e, principalmente, resiliência”, informa.

Olhando para o presente/futuro

Não há como fazer uma escolha tão determinante na vida pessoal e profissional sem considerar as expectativas do setor para os próximos anos e as tendências para a carreira. Isso implica, consequentemente, em entender a dinâmica do mercado de trabalho.

“Penso que uma das coisas mais relevantes que a gente precisa considerar é exatamente que o mercado é dinâmico. Às vezes, percebo pessoas pensando sobre mudança de carreira ou em iniciar uma carreira com o olhar, digamos, estático, para este mercado. Chamo de olhar estático aquele sob a ótica apenas da pessoa, do que deseja fazer, crescer e se desenvolver”, afirma Ana Cantarelli.

A especialista explica que é premente a necessidade da compreensão de que o mercado de trabalho está inserido num contexto sócio-político, cultural e econômico.

Não é, portanto, um ente separado do resto do mundo, do que está acontecendo na sociedade. “É preciso entender como, efetivamente, um movimento. Então, essas possibilidades de atuação para escolha da profissão vão se modificando e, em algum momento, ciclos vão se reproduzindo.

Então, você verá, por exemplo (neste processo pandêmico), mais necessidade de profissionais da área de saúde (não apenas médicos, mas pesquisadores, biólogos, biocientistas). É um olhar mais amplo para associações desta área com outras. Isto é a dinamicidade do mercado que não é mais, apenas, aquele formato estático em que eu escolho exercer uma profissão e vou passar a vida fazendo aquilo. A gente já sabe que não é assim”, afirma Cantarelli. 

Futuro por escolhas e entregas

A especialista vê, portanto, o futuro não como um momento em que haverá profissões no modelo que conhecemos hoje, mas um panorama profissional marcado por escolhas de atuação que resultarão em entregas relevantes para a sociedade.

“Uma pessoa da área de saúde, por exemplo, pode trabalhar com tecnologia inserida no movimento de pandemias para o futuro. Já, atualmente, se abre a questão de olhar para as múltiplas habilidades e afinidades que as pessoas precisarão aprender para tocar estas multifacetadas possibilidades que o futuro trará”, explana.

Ana lembra que, quando se fala desse futuro, não se refere a 2030 ou 2050, mas a situações concretamente atuais em que será necessária a composição de algumas áreas com outras com que teoricamente, em outros momentos, nem conversavam.

“Há 20, 30 anos, os pais desses jovens que estão entrando no mercado de trabalho agora ou buscando as definições de suas profissões, estavam começando suas carreiras. Suas escolhas eram trazidas a partir de uma área de afinidade. Quem gostava de biologia ou química, iria para saúde. De física ou matemática, para exatas. De história, geografia ou português, para humanas. Isto não é mais tão rígido neste momento. Há uma necessidade desse olhar múltiplo para construirmos essas novas demandas que a sociedade pede destes profissionais”, analisa.

Conceitos a respeito da dinâmica atual de mercado importantes não somente nesse processo de escolha de profissão, mas também para os recém-formados.

“Muitos entram no mercado sem esse conhecimento suficiente, sem entender quais são os desafios por não ter tido orientação a respeito. Ficou, então, este gap de desenvolver um olhar mais amplo, de olhar para estas possibilidades de futuro. É possível que em algum momento um pai ou mãe, mesmo com melhor das intenções, não esteja conseguindo sugerir, opinar e apoiar esse adolescente no modelo mais adequado para este momento”, explica Cantarelli.

Vocação x Retorno financeiro?

É de certa obviedade a importância de se considerar o retorno financeiro como fator relevante para a decisão a respeito da profissão almejada. Quando se pensa em vida profissional futura, é natural, saudável e fundamental que ela seja encarada como provedor, fator propulsor da realização de sonhos e projetos. Essa escolha nunca deve, entretanto, ser baseada apenas no aspecto financeiro. 

Afinal, é a rotina de trabalho que responderá por boa parte do tempo despendido em sua rotina, e por vários anos.

“Eu tendo a ver essa busca constante de bem-estar e que as empresas também querem. Afinal, já se prova que quem está feliz no ambiente de trabalho rende muito mais, faz entregas mais consistentes, tem mais resultados efetivos.

O caminho, então, é escolher o que se gosta, com o que tenha afinidade. O que vier daí é uma construção do que se pode buscar de sinergia com outras áreas, de convergência de agregação, de ouvir pessoas que estão em áreas completamente diferentes da sua e ver “onde agrego isso com o que faço, que entrego para organização, para minha carreira”, explica Ana.

Além disso, as constantes mudanças no mercado de trabalho indicam que não há garantias de que a boa remuneração de determinada área no momento presente, prossiga assim em anos futuros. 

Do ponto de vista psicológico, a resposta à questão “vocação x retorno financeiro” é que não existe receita de bolo, segundo Ana Paula Muhlert. “O ideal é que haja um equilíbrio. É importante a pessoa entender um pouco do seu perfil profissional (por meio de testes vocacionais, avaliações de perfil), olhar as tendências de mercado e, principalmente, responder qual o objetivo profissional. O que ela valoriza, qual o seu propósito? Algumas buscam flexibilidade, outras segurança financeira, reconhecimento ou status”, afirma. 

BOX DE PERGUNTAS

A escolha da profissão é algo pelo qual o estudante pode passar individualmente ou recorrer à ajuda especializada de um psicólogo caso haja insegurança, dúvidas ou total falta de horizontes a este respeito e conhecer o mercado de trabalho é fundamental.

De acordo com a psicóloga Ana Paula Muhlert, o teste vocacional, por exemplo, promove o autoconhecimento. “O profissional aplica uma avaliação de perfil que acaba apontando para áreas de afinidade, expectativas, habilidades intrínsecas do jovem, personalidade, valores. E esta avaliação é muito válida porque oferece um norte”, explica. 

Seja isoladamente ou com apoio profissional, fato é que trabalhar o autoconhecimento pode ser fundamental para identificar as próprias tendências. Responder a algumas destas perguntas pode auxiliar nesse processo:

  1. O que eu gosto de fazer e o que eu não gosto?
  2. O que eu gostaria que fizesse parte da minha rotina e o que eu não gostaria?
  3. Quais são as minhas habilidades?
  4. Eu gostaria de usar minhas habilidades no trabalho?
  5. Quais são as minhas dificuldades?
  6. Prefiro lidar diretamente com pessoas ou com coisas?
  7. O que me motivaria a acordar cedo todos os dias?
  8. Qual estilo de vida eu gostaria de ter?
  9. Quanto dinheiro é necessário por mês para sustentar o estilo de vida que eu gostaria de ter?
  10. Há alguma profissão que eu realmente gostaria de saber mais a respeito?
  11. Além da graduação, estou disposto a fazer pós-graduação e outros cursos que podem ser exigidos em determinadas profissões?
  12. O que me faria muito feliz em estudar sobre?
  13. Quanto eu estou disposto a estudar para ser aprovado caso o curso que eu escolha seja muito disputado?
  14. Quantas horas por dia eu gostaria de trabalhar?
  15. Como eu gostaria de estar daqui 10 anos? Para isso, conhecer o mercado de trabalho é fundamental.

O quanto pais e responsáveis podem e devem influenciar?

Seja isoladamente ou com apoio profissional, o fato é que a escolha profissional é, realmente, um grande e importante passo da vida. E, apesar de o diálogo com a família ser importante, é fundamental entender que esta escolha deve ser feita sem pressão ou influência extrema de outras pessoas, mesmo que estas sejam pais ou mestres.

Em que medida, então, esta opinião alheia deve contribuir para a decisão? “Muitos jovens gostam de algo, mas não têm certeza sobre o que fazer e os pais lembram que determinada área dá ou não dinheiro, por exemplo. É bom lembrar que interferência sempre vai haver. Não apenas de familiares, mas de amigos, conhecidos, inclusive até da internet. Por isso as avaliações são tão benéficas”, analisa Ana Paula.

Como a escola pode auxiliar na busca pela profissão?

A psicóloga Ana Paula afirma que, em seu consultório, atende jovens adultos que não são felizes em suas vidas profissionais, o que mexe com todo o seu sistema emocional. No trabalho, procrastinam, fazem as coisas sem vontade.

Isso interfere no resultado e, consequentemente, no reconhecimento. O que pode resvalar para depressão ou crises de ansiedade. “Muitos começam a ficar ansiosos no domingo porque no outro dia a rotina recomeça. Ainda que bem remunerados, não sentem prazer fazendo aquilo. Então, a escola pode auxiliar fazendo com que os estudantes vivenciem um pouco a prática das profissões, conhecendo o mercado, com feiras, vídeos, chamando profissionais para fazer palestras. Lembrando que não é necessário esperar que o jovem atinja os 16 ou 17 anos para fazer essas apresentações. Crianças de 7 anos já pedem para conhecer realidades de alguns profissionais e isto pode ser muito salutar”, conclui. 

Gostou de conhecer sobre o mercado de trabalho e ler sobre o tema? Então saiba mais sobre o professor do presente e o ambiente virtual!

Patrícia Monteiro de Santana

Jornalista formada pela Universidade Federal de Pernambuco em 2000. Com atuações em veículos como TV Globo, Revista Veja e Diario de Pernambuco, além de atuante em assessoria de comunicação empresarial, cultural e política.