progressão de aprendizagem na educação escolar

Quem vive o “chão da escola” habita o vale das perguntas inquietantes diante de tantas (trans)formações desse espaço naturalmente mutável e que é atravessado, cotidianamente, pelas acontecências, vivências e experiências no ver, fazer e sentir o mundo, especialmente na questão da progressão de aprendizagem.

É sabido que todos/as os/as estudantes possuem igualdade de direitos à educação e à aprendizagem, conforme garantido pela Constituição Federal e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Ao mesmo tempo, reconhecemos que nem todo/a estudante consegue atingir igualmente os objetivos estabelecidos no planejamento educacional.

Ao lembrarmos que os/as educandos/as são indivíduos únicos, repletos de particularidades, como podemos esperar que todos aprendam da mesma forma e ao mesmo tempo? Todos precisarão lançar-se a altos voos, mas nem todos possuem as mesmas asas.

Nesse contexto, deparamo-nos com dois dos grandes desafios do fazer docente: a avaliação da aprendizagem e as metodologias de ensino.

Esses domínios da prática docente são árduos, dada a natureza de suas complexidades e a dificuldade em encontrar caminhos viáveis dentro da realidade da escola.

Nos últimos anos, o termo “acompanhamento das progressões de aprendizagem” tem surgido e ganhado espaço nos debates escolares como uma maneira de provocar reflexão coletiva sobre como identificar, de forma mais sensível, as particularidades no desenvolvimento da aprendizagem dos alunos, levando em consideração seus aspectos individuais.

A partir dessas análises, é possível obter informações úteis para o fazer docente e a gestão escolar, subsidiando reformulações curriculares abrangentes, repensando as metodologias e práticas pedagógicas.

As análises das progressões de aprendizagem, juntamente com seus indicadores pré-definidos, podem avaliar as efetivas alterações no aprendizado de cada estudante em um determinado período.

Identificar as competências individuais para a progressão da aprendizagem

O início de todo ano escolar traz consigo a possibilidade de implementar novos planejamentos. A atmosfera da escola está contagiada pela energia após o descanso da comunidade escolar, tornando-se o momento fértil para iniciar a caminhada com acolhimento dos/as estudantes e, logo após, iniciar um processo avaliativo de forma formativa e comprometida com o progresso do alunado.

Compreender como cada aluno/a chegou, o que trazem de conhecimento na bagagem e qual é a realidade socioemocional de cada um/a é o primeiro passo para alinhar possíveis práticas com o grupo-classe.

É fundamental que cada docente tenha definido quais são os objetivos de aprendizagem para o ano em curso e quais são as hipóteses possíveis para alcançá-los. No entanto, o “como fazê-lo” deve surgir após uma cuidadosa avaliação diagnóstica.

É importante utilizar instrumentos variados para essa avaliação e que esses estejam alinhados às competências que precisam ser mapeadas.

Além das tradicionais avaliações escritas, que são potentes e revelam muitos elementos, é interessante considerar rodas de conversa, o uso de filmes que possam desencadear debates, dinâmicas de grupo, atividades tipo “mão na massa”, ou atividades lúdicas que permitam que o/a aluno/a deixe evidências de como ele/a está naquele momento.

A partir disso, o/a docente pode, além de diagnosticar as questões individuais, pensar em estratégias para um trabalho coletivo e colaborativo entre estudantes e, dependendo dos objetivos e da etapa da escolarização, envolver docentes e outros membros da equipe pedagógica (psicólogos/as, pedagogos/as, assistentes sociais etc.).

A retomada do planejamento para a progressão de aprendizagem

As análises das evidências de aprendizagem após a avaliação diagnóstica formam um rico material para a retomada do planejamento inicial.

Estabelece-se um momento de ajuste dos objetivos comuns e dos objetivos individuais, com o intuito de proporcionar diferentes possibilidades de vivências didáticas e aprimoramento do percurso pedagógico, contribuindo para a construção gradual e contínua de um repertório científico.

A intervenção e avaliação periódica devem ocorrer, estabelecendo uma atmosfera cotidiana de análise e ajustes na caminhada, com replanejamentos e intervenções.

Alguns/as autores/as recomendam o uso de rubricas de avaliação, contendo os níveis de desempenho esperados para cada atividade realizada em sala de aula. Isso pode contribuir significativamente para o acompanhamento docente, desde que todas as etapas fundamentais para a construção de rubricas avaliativas sejam rigorosamente seguidas, sendo elas:

  1. a descrição geral da tarefa, que é objeto de avaliação;
  2. os critérios,
  3. os níveis de descrição do desempenho, conhecidos como indicadores ou descritores relativos a cada critério; e
  4. definição de uma escala que corresponda a um determinado indicador ou descritor.

Esse processo pode subsidiar a criação de mapas de aprendizagem que se tornam espaço de registro e acompanhamento do aprendizado discente no cotidiano escolar.

Na prática, o que fazer?

Depois da avaliação diagnóstica e do mapeamento inicial, é momento de implementar diversas estratégias.

É fundamental utilizar estratégias que permitam ao/à estudante em um nível mais avançado continuar aprendendo e se sentir estimulado a adquirir novos conhecimentos, aprofundando-se.

Da mesma forma, é crucial respeitar o tempo do/da estudante que enfrenta dificuldades, criando momentos e ferramentas de ensino e aprendizagem que gradualmente possam construir uma base sólida em relação aos objetivos estabelecidos.

A heterogeneidade natural desse ambiente pode representar um desafio significativo para o professor, mas, com sensibilidade, criatividade e responsabilidade docente, é possível definir um plano individualizado e, assim, potencializar as aprendizagens.

Uma estratégia interessante é a organização da turma em agrupamentos por níveis de aprendizagem, para a realização de atividades direcionadas que contemplam a especificidade do grupo.

Esses momentos de agrupamento podem ocorrer tanto durante as aulas, sob a orientação do/a docente responsável pelo grupo, quanto no contraturno escolar, no formato de oficinas de aprendizagem, nas quais todos, independentemente do nível, participem.

Estudantes que estão em anos mais avançados podem atuar como monitores, auxiliando na execução das atividades nas oficinas.

Envolver estudantes de séries subsequentes para dar apoio aos/às estudantes em anos anteriores pode ser uma estratégia muito interessante, uma vez que o diálogo e a mediação se estabelecem entre os pares de forma mais horizontalizada.

Além disso, esse tipo de estratégia transborda para o estímulo de competências também nos/as estudantes-monitores/as.

Alternativas eficientes para trabalhar a progressão da aprendizagem

Outra alternativa muito eficaz é o uso da tutoria por professores/as ou membros da equipe pedagógica. A partir de encontros semanais, com duração aproximada de 30 a 60 minutos, o/a tutor/a torna-se a pessoa de referência para auxiliar o/a estudante na elaboração de um plano de estudo que leve em consideração a rotina semanal do/a aluno/a, suas especificidades (momentos de lazer, descanso, práticas de esportes, estudo em casa, por exemplo) e dificuldades (campos do saber que demandam maior tempo e investimento).

É fundamental que a equipe de tutoria possa se reunir periodicamente para discutir instrumentos, estratégias de acompanhamento e envolvimento dos/as tutorados/as, sempre alinhado aos objetivos de aprendizagem do/a professor/a responsável pela regência no grupo-classe.

A importante troca de informações entre monitores/as, tutores/as, professores/as e a equipe pedagógica é fundamental para compreender a forma como cada educando está respondendo às estratégias adotadas e, sempre que necessário, buscar novas alternativas.

Além disso, envolver as famílias para o diálogo constante na escola é crucial, tanto para compreender as dinâmicas familiares que podem favorecer ou dificultar o trabalho, quanto para responsabilizá-las como colaboradoras imprescindíveis no processo de aprendizagem. 

Conclusão

O acompanhamento da progressão de aprendizagem é e sempre será um grande desafio para a prática docente. No entanto, com o envolvimento coletivo e a implementação das estratégias acima mencionadas, é possível pensar em aprimorar continuamente o olhar tanto para o todo quanto para o individual, promovendo práticas educativas contínuas.

 A realização de análises periódicas para identificar o progresso, sempre com um planejamento cuidadoso e adaptado às dinâmicas individuais, equivale a estabelecer um plano de voo exclusivo para cada estudante. Isso envolve o respeito às suas trajetórias pregressas, à sua capacidade atual de voar mais alto ou mais baixo, até que todos possam atingir o céu pleno e aterrissar de forma segura nos novos desafios de aprendizagem.

Referências

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