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Machado de Assis no Ensino Médio: estratégias para engajar Alunos

30 de maio de 2025,
E-docente
Machado de Assis no Ensino Médio

Machado de Assis é, sem dúvida, um dos autores mais relevantes da literatura brasileira. Sua obra de alta qualidade e sua representativa trajetória de vida o consolidam, para muitos, como o maior escritor brasileiro de todos os tempos. No entanto, trabalhar com seus livros na escola nem sempre é uma tarefa fácil, considerando o estilo textual rebuscado e o contexto de suas narrativas, situadas no Brasil do século passado.

Essa distância temporal e a complexidade linguística podem, muitas vezes, repelir os jovens, que, antes mesmo de dar uma chance ao texto machadiano, já antecipam dificuldades. Isso ocorre, muitas vezes, por referências a trechos lidos fora de contexto ou por opiniões de outros leitores que não tiveram boas experiências.

Sem menosprezar a importância do olhar discente ou impor uma aceitação acrítica, este artigo explorará como é possível cativar os estudantes para a obra de Machado de Assis. Apresentaremos uma figura ímpar na história da literatura brasileira e buscaremos reconhecer os méritos de sua obra, sem precisar simplificar a aproximação inicial.

A Vida de Machado de Assis: Inspiração e Contexto

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro, em 1839. Sua vida começou de forma bastante humilde, sendo criado no Morro do Livramento por seu pai, pintor, e sua mãe, lavadeira. As informações sobre seus primeiros anos revelam que Machado teve uma infância difícil, como a de muitos meninos negros e pobres do Rio de meados do século XIX.

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No início da vida adulta, atuou como jornalista e escritor, produzindo diversos gêneros literários, como contos, crônicas, peças de teatro e poemas. No entanto, foi com os romances que Machado de Assis marcou seu nome na história, especialmente aqueles que compõem sua “trilogia realista”: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899).

O Fenômeno TikTok e o Encanto Machadiano

O primeiro, Memórias Póstumas de Brás Cubas, é, inclusive, considerado o marco inicial do Realismo literário no Brasil. A obra apresenta uma narrativa inovadora, que subverte conceitos tradicionais da literatura nacional da época, ao mesmo tempo em que tece críticas sofisticadas sobre a realidade burguesa.

Sobre Memórias Póstumas de Brás Cubas, um ponto que merece destaque e pode aproximar os jovens leitores de Machado de Assis é a recente viralização da obra no TikTok. A influenciadora literária norte-americana Courtney Henning Novak descobriu o livro e ficou encantada com seu enredo.

Novak chegou a declarar que Memórias Póstumas de Brás Cubas é “o melhor livro de todos os tempos” em um de seus vídeos, que atingiu quatro mil comentários e quase um milhão de visualizações. O sucesso foi tanto que o livro se tornou um dos líderes de vendas na Amazon americana, fortalecendo o interesse pela obra entre jovens leitores de várias partes do mundo. Posteriormente, a influenciadora também conheceu Dom Casmurro e, da mesma forma, compartilhou sua admiração pela obra, gerando uma nova onda de reações e debates online.

Leia mais: Literatura no Ensino Médio: Como trabalhar?

Esse episódio nos leva a refletir sobre o poder magnético do texto machadiano: se um romance desse autor foi capaz de cativar uma leitora estrangeira de um contexto socio-histórico tão diferente do descrito na obra, por que não seria possível despertar o mesmo interesse em leitores brasileiros?

A Mediação Docente: Chave para o Engajamento

Nesse ponto, a mediação docente assume uma importância fundamental. Geralmente, no Ensino Médio, Machado de Assis é uma leitura obrigatória do 2º ano, período em que os estudantes entram em contato com o Realismo brasileiro. Esse movimento literário do final do século XIX tinha como um de seus principais temas a decadência de uma sociedade burguesa em constante transformação.

Para um primeiro contato proveitoso entre a turma e a obra de Machado, o docente pode incentivar os estudantes a pesquisar nas redes sociais: o que é dito sobre Machado de Assis, quais reverberações sua obra costuma provocar, como e por que buscaram apagar sua etnia, quais autores contemporâneos o citam como grande influência e, até mesmo, como leitores estrangeiros relatam suas experiências de leitura. Esse tipo de pesquisa visa instigar a curiosidade dos alunos sobre a figura do autor, familiarizando-os com Machado de Assis antes de iniciar a leitura de suas narrativas.

Embora o conhecimento da biografia de um autor ou as informações sobre a recepção de sua obra não sejam imprescindíveis para uma boa experiência de leitura, é necessário reconhecer que atividades de aproximação, que “caminham pelas beiradas” antes da leitura propriamente dita, podem ser benéficas para quebrar possíveis resistências iniciais em relação ao seu nome.

Contos de Machado: Um Primeiro Contato Estratégico

Após as apresentações sobre o autor e o contexto de produção de suas obras, cabe agora iniciar a leitura. No entanto, antes de avançarmos para os romances, diversos contos de Machado podem ser uma boa oportunidade de primeiro contato para novos leitores.

Por serem narrativas mais curtas, alguns contos podem ser lidos integralmente em sala de aula. Essa prática permite que o estudante visualize no professor um referencial de leitor, observando como o ritmo, as pausas e as ênfases contribuem para um melhor entendimento da narrativa. Posteriormente, os alunos podem ser convidados a fazer uma leitura compartilhada desses textos, exercitando suas habilidades de leitura e compreensão.

Dentre as diversas sugestões entre os duzentos contos publicados por Machado de Assis, podemos destacar:

  • O Caso da Vara: aborda a naturalização da violência contra pessoas escravizadas, a hipocrisia nas dinâmicas familiares e a manutenção das aparências em espaços religiosos.
  • A Igreja do Diabo: com ironia e bom humor, nos provoca a refletir sobre a constante insatisfação humana e sua necessidade de subverter a ordem.
  • Pai contra Mãe: constrói com maestria o embate entre as demandas de um pai que precisa sustentar sua família e uma mãe escravizada que tenta fugir para se proteger. O encontro desses dois personagens no final do conto produz um momento de tensão angustiante, que ressoa na mente do leitor muito tempo após a leitura.

Aprofundando com os Romances: O Caso de Dom Casmurro

Após o contato com os contos e o debate sobre as questões morais exploradas por Machado, o docente pode sugerir a leitura de um romance. A turma já terá um conhecimento razoável sobre a linguagem do autor e conseguirá caminhar com certa autonomia pelas páginas do livro. Ainda assim, a mediação se faz necessária, na medida do possível, nos momentos de leitura coletiva em sala de aula e nos debates que determinados eventos podem suscitar.

Uma boa sugestão de leitura de romance machadiano é, sem dúvida, Dom Casmurro, talvez um dos livros mais populares da história da literatura brasileira. É um daqueles livros que muitos, mesmo sem o terem lido, já tiveram algum contato, seja pela personagem Capitu e seus “olhos de cigana oblíqua e dissimulada”, seja pela grande questão que gera debates há décadas: Capitu traiu ou não traiu?

Para incentivar uma leitura ainda mais atenta dos estudantes, é possível iniciar informando que Dom Casmurro é uma obra metalinguística, ou seja, um livro sobre um personagem que está escrevendo um livro. Nessa narrativa, o narrador-personagem irá repassar toda a sua vida, da infância à velhice, buscando entender como suas ações o levaram à situação em que se encontra no momento da escrita: um homem sozinho, vivendo sem a família em uma grande casa. O estudante pode ser motivado a tentar identificar, conforme avança pelos capítulos, quais atitudes e circunstâncias já prenunciavam o final trágico da obra.

A falta de confiança que o leitor pode desenvolver nos relatos do narrador também é uma camada interpretativa muito potente, capaz de gerar discussões sobre o modo tendencioso como a história é contada, com destaque para certos pontos e omissão de outros.

Atividades Pós-Leitura e Temas para Debate

Após a conclusão da leitura, o estudante pode realizar produções textuais mais formais, como uma resenha sobre a obra, comentando seu processo de leitura e os aspectos que mais lhe chamaram a atenção; ou até produções literárias, como a escrita de uma carta para o narrador-personagem, na qual pode expressar sua opinião sobre o desenvolvimento da história, considerando o contexto original de produção da obra.

Além de trabalhos relacionados diretamente com o livro, há oportunidades de aprofundamento do repertório sociocultural do estudante, com pesquisas e discussões sobre temas como:

  • O peso da religião na vida familiar.
  • O modo machista como o comportamento feminino costuma ser avaliado.
  • A evolução das relações matrimoniais.
  • Os sinais para identificar um relacionamento abusivo.
  • As hipocrisias cotidianas na estrutura social burguesa.
  • O racismo estrutural, que, durante considerável tempo, buscou apagar a etnia de Machado, embranquecendo sua identidade.

Como vimos, Machado de Assis nos ajuda a compreender melhor o nosso passado e as complexidades sociais do nosso presente. Em sua obra, observamos como sentimentos universais como medo, ganância, ciúme ou inveja são tematizados por uma linguagem literária que, ao mesmo tempo, provoca o leitor e o humaniza por meio de reflexões indiscutivelmente pertinentes.

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