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Histórias da educação que nos inspiram

10 de dezembro de 2025,
E-docente

Ana beatriz bezerra – aprovada no curso de medicina da UERJ

Muitos de nós vimos o emocionante vídeo viral em que uma estudante compartilha com sua mãe a notícia de sua aprovação no concorrido vestibular de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), enquanto esta chega em casa empurrando um carrinho de lanches. Ana Beatriz Bezerra, uma jovem carioca de 23 anos, tornou-se destaque em diversos portais de notícias e programas de TV. Sua mãe, Eliene Bezerra, trabalha vendendo lanches no centro do Rio de Janeiro há mais de uma década. O esforço e a dedicação de Eliene permitiram que Ana Beatriz frequentasse um curso pré-vestibular, essencial para sua preparação. 

Ana Beatriz trabalhou e estudou intensamente por 5 anos para conquistar sua vaga no curso mais concorrido da universidade. Sem um computador adequado, utilizou um caderno e um tablet para estudar. Após cinco tentativas, em 2024, alcançou a 8ª colocação. Antes disso, cursou um semestre de Enfermagem com bolsa do Programa Universidade para Todos (Prouni) em uma faculdade particular e chegou a ser aprovada em Biologia na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), mas decidiu persistir em seu sonho de cursar Medicina. A notícia da aprovação foi recebida com muita emoção pela família e rapidamente viralizou nas redes sociais.

Gláucio ramos gomes – está entre os 50 melhores professores do mundo

Formado em Letras, com mestrado e doutorado em Linguagem e Cultura, Gláucio Ramos Gomes é professor e atualmente Secretário Executivo Pedagógico do município de Paulista, Pernambuco, onde atua no desenvolvimento de políticas públicas para a formação de leitores. Além de professor, é contador de histórias, autor infantil e empreendedor social.

Em 2017, criou o projeto social Leitura na Esquina, uma biblioteca itinerante montada em um trailer que percorre escolas da rede municipal e espaços comunitários, oferecendo um acervo de mais de cinco mil obras de literatura infantojuvenil. O projeto promove atividades como contação de histórias, jogos de leitura e empréstimo de livros.

Leia mais: A importância da rede de apoio para professores: como a ajuda mútua fortalece a educação

Gláucio recebeu diversos prêmios pelo impacto e alcance do seu trabalho, entre eles: Detran de Educação (2018), Professores do Brasil – MEC (2018), Prêmio Maria da Penha Vai à Escola (2019), Prêmio Espírito Público (2019), Prêmio Destaque Educação (2021), Prêmio Ciência para a Educação na Sala de Aula (2021), Candango de Literatura (2022), Prêmio Iberoamericano de Liderança Social (2023) e o recente Prêmio Global Teacher Awards (2024), de grande relevância internacional.

Apenas o esforço individual?

Todos já passamos pela sala de aula e sabemos dos desafios que o processo de ensino-aprendizagem impõe. Estudar exige compromisso, dedicação e disciplina, e nem sempre é fácil. Muitas vezes, estudar cansa, frustra e tira o sono.

Como professora, frequentemente sou questionada sobre como criar o hábito da leitura em crianças e jovens. Contudo, prefiro encarar a leitura como um encontro, inspirado no Pequeno Príncipe:

Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieto e agitado: descobrirei o preço da felicidade!   O Pequeno Príncipe (Antoine de Saint-Exupéry)

A escola também deveria ser um lugar de encontros, onde nos deleitamos na presença do outro e do conhecimento, momentos em que não queremos que as horas passem, em que podemos até fazer propostas aparentemente insanas, como diz Nando Reis na canção Relicário: “[…] eu trocaria a eternidade por esta noite […]”. No entanto, nem todos os encontros são assim. Alguns são aguardados com encantamento, como a relação entre o príncipe e a raposa, enquanto outros provocam desconforto, um nó na garganta. Assim é o processo educacional: ora nos encantamos, enchemos o coração de esperança e alegria; ora sentimos frustração diante da falta de condições para oferecer uma educação de qualidade.

Leia mais: Formação continuada de professores: quem são os protagonistas deste processo?

O que eu quero dizer é que o caminho da educação não é linear nem igual para todos. Muitas vezes, a escassez de recursos torna o aprendizado ainda mais desafiador. Salas de aula quentes, sem materiais adequados, acesso precário à internet e bibliotecas dificultam o desenvolvimento de alunos e professores. Além disso, a ausência de condições essenciais, como merenda, transporte escolar e material didático atualizado, compromete a permanência dos estudantes na escola.

Nesse cenário desigual, estudantes como Ana Beatriz enfrentam desafios constantes, equilibrando trabalho e estudo para alcançar seus sonhos. Do mesmo modo, iniciativas transformadoras, como a de Gláucio, esbarram em dificuldades financeiras que limitam sua continuidade e expansão, evidenciando que o esforço individual, por si só, não é suficiente para superar as barreiras impostas pela realidade educacional.     

Desmistificando a meritocracia das conquistas

A ideia de que o sucesso é alcançado exclusivamente pelo esforço pessoal ignora as desigualdades estruturais. A meritocracia pressupõe um ponto de partida igual para todos, mas desconsidera fatores como origem social, raça, gênero, condições econômicas, acesso a recursos e apoio familiar. Valorizando apenas resultados individuais, essa visão pode gerar exclusão e estigmatização de estudantes em situações de vulnerabilidade. O que impõe, a alunos como Ana Beatriz, um esforço individual maior. Ela precisou estudar e trabalhar, além de contar com a ajuda da sua mãe que todos os dias saía com seu carrinho de lanche para custear o cursinho preparatório para o vestibular da filha.

Além disso, a crença na meritocracia pode criar um ambiente altamente competitivo e excludente, gerando ansiedade e esgotamento emocional. Os professores, por sua vez, também enfrentam essa pressão, muitas vezes se sentindo impotentes diante de uma realidade que exige mais do que simples esforço individual. O professor Gláucio, por exemplo, embora seja extremamente reconhecido pelo alcance e impacto de seu projeto de leitura, nem sempre consegue o apoio necessário para sua realização. Ele precisou, por exemplo, recorrer a uma vaquinha on-line para cobrir as despesas de sua participação na cerimônia de premiação do Prêmio Global Teacher Awards 2024, na Índia, uma das premiações mais prestigiadas mundialmente na área da Educação.

Portanto, essa ideia de meritocracia é muito perigosa. Além disso, ao valorizar apenas os resultados individuais, a meritocracia na Educação pode estimular estigmas e exclusões, culpabilizando alunos e/ou professores por seu desempenho acadêmico, sem considerar as barreiras socioeconômicas que enfrentam. Cada indivíduo tem um contexto único, e a Educação deve considerar diferentes ritmos de aprendizagem, habilidades e trajetórias. A meritocracia muitas vezes ignora essas particularidades, promovendo uma visão limitada de sucesso baseada em padrões rígidos.

Embora o mérito e o esforço sejam importantes, é essencial que a Educação reconheça e combata as desigualdades sociais para garantir um sistema educacional verdadeiramente inclusivo e justo para todos. Neste contexto, precisamos refutar o discurso meritocrático porque ele pode reduzir a capacidade de investimentos em políticas educacionais inclusivas, como cotas, assistência estudantil, programas de equidade, inclusão digital e formação continuada de professores sob o argumento de que cada indivíduo deve alcançar o sucesso por conta própria.

Histórias como a de Ana Beatriz e o professor Glaucio nos lembram que, para que a verdadeira meritocracia exista, é necessário um sistema que nivele as chances, proporcionando a todos, independentemente de sua origem socioeconômica, as ferramentas necessárias para o sucesso.  

Conclusão

Em resumo, as histórias da estudante Ana Beatriz e do professor Gláucio nos inspiram a sonhar e a desafiar o status quo da Educação, provando que, mesmo diante das barreiras sociais, é possível alcançar nossos objetivos e, ainda mais importante, criar oportunidades para que outros sigam conosco. Suas trajetórias têm um impacto profundo em suas comunidades, revelando que o sucesso de um reflete o sucesso de todos, fortalecendo o coletivo.

Minicurrículo da autora

 Patrícia Rosas é Professora Adjunta do Departamento de Metodologia da Educação (DME) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB); atuando no Curso de Pedagogia; Pós-Doutora em Linguagem e Ensino pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG); Doutora em Linguística (com Doutorado-Sanduíche na Universidade Federal de Buenos Aires/UBA, Argentina); Mestre em Linguagem e Ensino (UFCG); Graduada em Letras pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e Pedagogia pela Unidade de Centro Universitário de Maringá (Unicesumar).

Como professora da Educação Básica (2003-2023), criou o Projeto de Leitura e Escrita Desengaveta Meu Texto e a Revista Tertúlia. Esses projetos lhe renderam prêmios e indicações, como o Prêmio LED – Luz na Educação (2022) da Rede Globo e da Fundação Roberto Marinho; o Prêmio Melhores Programas de Incentivo à Leitura para Crianças e Jovens de todo o Brasil (2019), da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ); além de três indicações como finalista do Prêmio Jabuti, Eixo Inovação, Categoria Fomento à Leitura (2018, 2019, 2021).   

Referência

SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O Pequeno Príncipe. 48. ed. Rio de Janeiro: Agir, 2009.

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