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É comum nos depararmos com situações nas quais precisamos ponderar sobre determinados fatos e fazer escolhas, selecionar, ou seja, avaliar e, qualquer que seja o contexto, essas tarefas não são fáceis, sobretudo se os critérios que devem orientar essas ações não estiverem claros.

O mesmo se dá com a avaliação que ocorre na escola: é preciso ponderar e avaliar. Para tanto, porém, é preciso haver reflexões sobre a avaliação, de um modo mais abrangente, e sobre os instrumentos e critérios avaliativos.

Quer saber mais sobre avaliação em língua portuguesa?
Então confira o conteúdo que preparamos para que você possa refletir sobre os instrumentos e os critérios avaliativos!

Como anda a Avaliação em Língua Portuguesa na escola?

Como anda a Avaliação em Língua Portuguesa na escola?

Hoje em dia, ainda é possível nos depararmos na escola com vivências avaliativas que se aproximam do paradigma tradicional. Ou seja, que têm como base a medida e o foco na classificação, buscam objetivos fixos e carregam uma visão negativa do erro.

Essa perspectiva estrutural e somativa, que possui uma visão estática do conhecimento, leva ao uso de instrumentos igualmente engessados, como as provas, já que permitem uma quantificação exata dos erros e a localização precisa dos “problemas” a serem sanados (MENDONÇA, 2007).

Um estudo realizado por Gatti (2003) mostrou que grande parte dos estudantes avaliados sob essa perspectiva não sabe informar quais foram os critérios usados pelos professores para determinar as notas e conceitos que receberam nas atividades avaliativas que realizaram.

Essa ausência de critérios para correção deixa, como diz Moretto (2002), os alunos “nas mãos do professor”. Ou seja, vale o que o professor queria que o estudante tivesse respondido.

Segundo o autor, é por isso que, muitas vezes, durante a avaliação, os alunos levantam a mão e perguntam: “Professor, o que o senhor quer mesmo nesta questão 5?”.

Em outras palavras, não se trata de querer saber o que diz a questão, o que propõe o seu comando, mas o que o professor deseja.

Essa realidade comprova a importância de refletirmos sobre novas formas de avaliação e a necessidade de definirmos critérios avaliativos, bem como de explicitarmos esses critérios para os alunos.

Outras formas de Avaliação em Língua Portuguesa são possíveis? 

Nesse caminho de construção de novas perspectivas avaliativas que se distanciam da concepção tradicional, ganha força a avaliação como discurso (SUASSUNA, 2007), que se constitui como uma forma de acompanhamento das atividades dos estudantes com o objetivo de informar o que foi ou não construído em termos de aprendizado, de modo que o professor possa realizar as intervenções necessárias.

Por “ter algo a dizer” (HADJI, 1994, 2001), essa avaliação funciona como uma rede de palavras e de sentidos: o professor interpreta dados, questiona respostas, presta atenção aos sinais e singularidades.

Nesse tipo de avaliação, os resultados dos estudantes não são definitivos nem inquestionáveis e exigem um cuidadoso trabalho de interpretação, discussão e crítica, como bem destaca a pesquisadora.

No contexto desta avaliação formativa, outros instrumentos avaliativos ganham espaço, como a autoavaliação, e a definição de critérios mostra-se imprescindível.

Algumas reflexões importantes sobre essas diferentes perspectivas avaliativas podem ser vistas numa conversa entre as estudiosas Lívia Suassuna e Beth Marcuschi, apresentada no vídeo a seguir, que foi produzido pelo Centro de Estudos em Educação e Linguagem (CEEL), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE):

Como proceder quando o assunto é a Avaliação em Língua Portuguesa?

Se situarmos essa discussão no ensino de Língua Portuguesa, a reflexão sobre instrumentos e critérios avaliativos deverá perpassar sobretudo o trabalho com a produção de textos, uma vez que, segundo Geraldi (2006), é a partir do texto do aluno que o professor é capaz de identificar o que ele sabe e o que ele ainda precisa aprender em termos de uso da língua.

É também a partir do texto produzido pelo estudante que o professor saberá que encaminhamentos deverá dar para que o aluno construa o aprendizado necessário ao seu desenvolvimento enquanto usuário competente da língua.

Nesse sentido, a atividade de produção de textos seria o instrumento avaliativo mais adequado para dizer ao professor sobre o aprendizado dos seus alunos.

No entanto, neste trabalho com a produção de textos, o professor também precisa especificar quais são as condições de produção e os critérios que orientarão a avaliação.

Exemplos

Tomemos como exemplo o texto abaixo, retirado de uma pesquisa realizada por Suassuna (2017). O texto foi produzido por um aluno do 6º ano de uma escola pública de Pernambuco, fruto de uma atividade proposta pela professora no âmbito do Dia Internacional da Mulher, na qual os alunos deveriam, após a leitura de uma reportagem sobre violência contra a mulher, escrever sobre a necessidade de que as vítimas denunciarem os seus agressores para que houvesse maior efetividade da Lei Maria da Penha.

Em relação às orientações dadas para a atividade, a professora não especificou qual deveria ser o gênero textual a ser escrito, tampouco o seu destinatário ou finalidade, ou seja, não deixou claras as condições de produção do texto, assim como não explicitou os critérios de avaliação.

Fonte: SUASSUNA, Lívia. Avaliação da escrita escolar: a importância e o papel dos critérios. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 66, p. 275-293, out./dez. 2017. Disponível em: SciELO – Brasil – Avaliação da escrita escolar: a importância e o papel dos critérios 1 Avaliação da escrita escolar: a importância e o papel dos critérios 1. Acesso em: 07 de dezembro de 2021.

Nessa produção, podemos observar a presença de um homem, que carrega algo parecido com um bastão, e de uma mulher. Os balões sobre suas cabeças indicam que eles estão conversando. No entanto, observamos que, do modo como estão escritas nos balões, essas falas seriam do narrador, não das personagens.

Assim, o texto desse aluno nos diz que ele ainda não consegue diferenciar a narrativa em quadrinhos da narrativa em prosa, bem como o discurso direto do indireto, como bem destaca Suassuna em sua análise.

Como se pode ver, as dificuldades do estudante ao produzir a narrativa têm relação direta sobretudo com a ausência de informações sobre as condições de produção por parte do professor, bem como sobre os critérios avaliativos.

Para continuar pensando…

Além disso, o comentário feito pela docente no texto – “Não é fala dos personagens e sim do narrador” – também não se mostra suficiente para que o estudante construa o aprendizado e proceda às etapas de revisão e reescrita, essenciais à tarefa de produção textual.

Considerando, então, conforme defende Geraldi (2006), uma atitude interlocutiva, seria necessário que, diante do dizer do aluno, houvesse também o dizer do professor: respeitando a palavra do aluno, o professor deveria questionar, orientar, acrescentar etc. e, a partir do retorno recebido, conduzir a novas produções, dando forma à tal rede de palavras e de sentidos defendida por Hadji (1994, 2001). 

Conclusão

Ainda que tenhamos refletido sobre instrumentos e critérios de avaliação, entendemos que avaliar não é somente uma questão de técnica ou de método, mas também uma experiência histórica, uma ação ética e política (SUASSUNA, 2007). Nesse sentido, precisa cumprir sua função discursiva.

Para tanto, como vimos, a escolha dos instrumentos e a definição de critérios são ações decisivas para que o aluno compreenda como fazer e o que precisa fazer em suas atividades avaliativas, não para devolver ao professor o discurso autorizado pela escola em forma de respostas prontas e acabadas, mas para dizer o que pensa sobre o mundo.

É disso que depende o sucesso do processo avaliativo, de modo específico, e do processo de ensino-aprendizagem, de modo mais geral, como práticas comunicativas.


Hérica Karina Cavalcanti de Lima

é Doutora em Educação (UFPE), na linha de pesquisa Educação e Linguagem, com período sanduíche no Laboratório de Investigação em Ensino de Português (LEIP), da Universidade de Aveiro/Portugal. É também Mestre em Educação (UFPE), na linha de pesquisa didática de conteúdos específicos, Especialista em Língua Portuguesa e licenciada em Letras (UPE). Atua como professora adjunta do Departamento de Letras da UFRPE e como docente colaboradora do Mestrado Profissional em Letras da UFPE. Realiza pesquisas e trabalhos nas áreas de ensino de língua materna, metodologias de ensino, formação de professores e materiais didáticos de português.

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Referências 

GATTI, Bernadete Angelina. O professor e a avaliação em sala de aula. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, SP, n. 27, p. 97-114, jan./jun. 2003.

GERALDI, João Wanderley (Org.). O texto na sala de aula. 4. ed., São Paulo: Ática, 2006.

HADJI, Charles. A avaliação desmistificada. Porto Alegre: Artmed, 2001. 

HADJI, Charles. A avaliação, regras do jogo – das intenções aos instrumentos. 4.ed., Porto: Porto Editora, 1994.

MENDONÇA, Márcia Rodrigues de Souza. Análise linguística: por que e como avaliar. In.: MARCUSCHI, Beth. SUASSUNA, Lívia. Avaliação em língua portuguesa: contribuições para a prática pedagógica. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.

MORETTO, Vasco Pedro. Prova – um momento privilegiado de estudo, não um acerto de contas. Rio de Janeiro, DP&A, 2002.

SUASSUNA, Lívia. Paradigmas de avaliação: uma visão panorâmica. In.: MARCUSCHI, Beth. SUASSUNA, Lívia. Avaliação em língua portuguesa: contribuições para a prática pedagógica. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.SUASSUNA, Lívia. Avaliação da escrita escolar: a importância e o papel dos critérios. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 66, p. 275-293, out./dez. 2017.