etapas processo escrita anos iniciais

As práticas de escrita na escola, por muito tempo, foram concebidas como “produto” – escreve-se sobre um tema para que o professor ou a professora corrija. Uma atividade escolar com fim em si mesma.

Além da dificuldade que muitos alunos enfrentam ao produzir textos – atividade altamente complexa que requer a ativação cognitiva de diferentes aspectos da língua e da linguagem, comumente a ausência das práticas de avaliação formativa dos textos dos estudantes. De modo que a tarefa de escrever possibilitasse cada vez mais e melhor desenvolver diferentes habilidades de produção textual.

Em sentido contrário a esse, uma proposta de etapas didáticas – as sequências didáticas – mostram-se profícuas ao organizar pedagogicamente os movimentos de ensino e aprendizagem de produção textual que possibilite subsidiar o professor com elementos para uma reflexão contínua sobre a sua prática, a partir da análise crítica dos textos dos alunos.

Entende-se sequência didática como “um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito” (Dolz e Schneuwly, 2004, p. 97).

Dessa forma, é imperativo ansiar pela readequação do ensino no que se refere às propostas de ensino de Produção Textual: definição clara dos objetivos pelas escolas por meio de uma abordagem mais funcional, real e sequencial nas aulas de Produção Textual.

Sob essa perspectiva, o ensino de escrita assume um caráter processual à medida que possibilita a integração dos eixos de oralidade, leitura e análise linguística em prol da ampliação das habilidades de produzir textos, uma vez que a organização do texto escrito é facilitada pela organização do pensamento via oralidade.

Investimento em gêneros textuais para a escrita

O investimento em leitura dos gêneros textuais a serem escritos favorece a compreensão das marcas macro e microestruturais desses textos e o estudo dos aspectos gramaticais ganham funcionalidade quando há reflexão sobre os usos dos elementos linguísticos nos textos produzidos.

As perspectivas discursivas em Língua Portuguesa e Alfabetização defendem a premissa de que se aprende a escrever… escrevendo! 

Sendo assim, mesmo que os estudantes ainda não tenham o pleno domínio do sistema de escrita alfabética e das convenções ortográficas, a escola precisa estimular situações de uso social da escrita significativas, prática que reflete a concepção de linguagem como atividade discursiva, o texto como unidade de ensino e a noção de gramática como relativa ao conhecimento que o falante tem de sua linguagem.

O trabalho de escrita, desde o 1º ano do Ensino Fundamental, baseado em sequências didáticas, necessita levar em consideração importantes elementos que nortearão o início, o desenvolvimento e o fim das propostas:

  1. os gêneros textuais/ discursivos, considerando sua estrutura (macro e micro),
  2. conteúdo composicional,
  3. interlocutores,
  4. contexto de produção,
  5. esferas de circulação social e suporte.

Esses elementos, organizados por sequências didáticas com etapas pré-definidas pelo professor e compartilhadas com os estudantes, como exemplificado a seguir, contribui para uma visão integrada de aprendizagem da Língua Portuguesa: a produção de textos orais/escritos/multimodais se concretiza por meio da leitura, escrita, e atividades de oralidade.

Etapas da Escrita

1. Rodas de conversa

Ao propor uma atividade de produção escrita, o professor necessita investir em atividades orais, com a mediação docente, de modo que os estudantes participem ativamente da proposta, levantando hipóteses sobre a tarefa, conversando sobre o gênero textual que vão escrever, o conteúdo temático do gênero, os interlocutores dos textos, a forma de divulgação/ publicação das produções e as demais etapas que serão seguidas até a escrita da versão final. 

É importante que, nesta etapa, os alunos já tenham lido previamente diferentes textos do mesmo gênero que serão motivados a escrever. Ao propor, por exemplo, a escrita de um conto infantil, garantir que já tenham lido diferentes contos anteriormente.

2. Planejamento

O momento de planejamento da escrita é fundamental em uma proposta de produção de textos como processo. Nesta etapa, os estudantes terão a oportunidade de elencar elementos inerentes ao gênero textual a ser produzido, planejando a sua escrita. 

É a etapa em que são acordados os aspectos macroestruturais e temáticos. Em uma produção de um conto infantil, por exemplo, definir com os estudantes a organização do texto em parágrafos que apresentam as sequências da narrativa, os elementos principais que devem aparecer, como os personagens e ambiente da história. 

O planejamento apoiará a primeira versão do texto dos estudantes.

3. Escrita

Em uma atividade de produção de textos como processo, a escrita faz parte de um conjunto de etapas. Escrever a 1ª versão de um texto, que sofrerá ajustes e revisões antes da escrita final é um hábito a ser cultivado pelos estudantes desde as primeiras produções.

4. Avaliação

Nesta etapa, os conhecimentos da estrutura do gênero e os aspectos da língua devem ser revistos, de modo que, funcionalmente, os estudantes percebam a importância do processo de revisão para adequação dos textos de acordo com os propósitos comunicativos definidos na etapa da roda de conversa.

A avaliação pode ser realizada de forma individual pelo aluno, em pares, coletivamente ou pelo professor, a depender do contexto de ensino em foco, sempre com critérios claros e compartilhados de avaliação com os estudantes.

Assim, espera-se que eles incorporem práticas revisionais de seus textos de forma autônoma e reflexiva. Uma interessante proposta para revisão das produções de texto em uma tarefa de escrita de contos, por exemplo, é a exploração de fichas autoavaliativas com perguntas sobre os aspectos de estrutura do texto e coerência e uso da língua e coesão, fomentando a reflexão dos estudantes em relação as suas próprias produções:

Estrutura do texto e coerência:

– Inseri os personagens?

– Caracterizei os personagens?

– Descrevi o ambiente?

– Marquei o tempo?

– Criei o conflito?

– Coloquei o desfecho?

– O texto está de acordo com a proposta?

– A letra está legível?

– O texto tem título?

– Organizei o texto em parágrafos?

Uso da língua e coesão:

– Usei ponto final?

– Utilizei o ponto de exclamação e interrogação quando necessário?

– Utilizei os dois pontos e o travessão para marcar as falas dos personagens?

– Escrevi letras maiúsculas nos nomes próprios? Depois do ponto final? No início de parágrafos?

– Fiz alguma substituição de nomes por pronomes?

– Fiz alguma substituição por sinônimos por não repetir muitas vezes a mesma palavra?

5. Reescrita

A partir da etapa de avaliação, que pode durar algumas aulas, os estudantes têm a oportunidade de reescrever os textos, adequando os aspectos revisados por meio dos critérios estabelecidos, visando à adequação de língua e linguagem aos objetivos da tarefa, aos contextos de produção e aos interlocutores em potencial.

6. Edição e Publicação

De acordo com as especificidades do gênero e o que foi decidido na etapa da roda de conversa, os estudantes farão a edição do texto para a publicação, de modo que, após a revisão e reescrita, a produção possa ser disponibilizada e lida pelos leitores definidos inicialmente.

Em se tratando de produções de contos, por exemplo, uma sugestão é a elaboração de uma coletânea física ou digital dos textos, de modo que a comunidade escolar e os responsáveis dos alunos possam ter acesso, efetivando a circulação social das produções.

A prática de ensino de produção de textos, por meio de sequências didáticas (etapas), aponta para uma mudança na concepção tradicional de ensino e aprendizagem da escrita: o foco se torna a proatividade do aluno, tornando-o protagonista no seu processo de aprendizagem, desenvolvendo sua autonomia.

Referência:

SCHNEUWLY, Bernard.; DOLZ, Joaquim. e colaboradores. Gêneros orais e escritos na escola. [Tradução e organização: Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro]. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2004.

Mario Sergio Mangabeira Junior é Mestre em Letras pela UFRRJ. Professor de Língua Portuguesa e Inglês da SME/RJ. Elaborador de material didático Rioeduca de Língua Portuguesa da SME/RJ. Atuação em formação continuada na área de Metodologia de Ensino de LP e Organização do Trabalho Pedagógico. Atualmente, é Assistente da Coordenadoria de Gestão Escolar da SME/RJ.