Esta reflexão nasce da necessidade de construirmos possibilidades e alternativas de acolhimento para a ação educativa de alunos e professores, em uma realidade nunca antes pensada e de um enorme desafio, que é atuar na educação no contexto da pandemia da Covid-19.

O que essa experiência tem nos proporcionado, nos contínuos dois anos de convivência com esse vírus, é a prioridade do cuidado com o humano.

A palavra “acolhimento” nas aulas presenciais e, ainda, no decorrer da existência desse vírus nos mostra que, além dos cuidados com o enfrentamento da doença, existem a ansiedade e a pouca clareza sobre os rumos posteriores dos hábitos humanos. 

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O sofrimento enfrentado com as perdas de pessoas e a incerteza de uma nova doença ditam as mudanças que se estabelecerão na forma como podemos conviver uns com os outros.

O impacto do momento atual na retomada às aulas

Hoje, estão estabelecidas algumas rotinas de cuidado contra o vírus:

  1. o uso das máscaras,
  2. os momentos virtuais de ensino,
  3. o afastamento físico,
  4. a proteção com a lavagem constante das mãos,
  5. e o uso do álcool em gel.

Isso tudo acarreta fragilidades emocionais em todas as pessoas e rebate, principalmente, na dinâmica escolar. 

Diante de toda essa mudança na rotina das crianças e dos adultos, é preciso apoiar o grupo para superação do medo e realizar ações para resgatar o desejo pela escola presencial novamente. 

É necessário buscarmos práticas com formas mais sensíveis de nos relacionarmos e, nessa organização, nada melhor do que nos nutrirmos das ideias e estratégias de acolhimento para esse objetivo.

É importante pensarmos que cada sentimento das pessoas envolvidas no espaço escolar é importante para a educação de todos os estudantes. 

Aqui vamos tratar, de forma cuidadosa, das principais vivências e estratégias de acolhimento para apoiar os estudantes, professores e coordenadores e gestores na organização de um novo cotidiano de ensino que possuirá um preparo criativo, atrativo e protagonista. 

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Nesse cenário de acolhimento, precisamos tratar das práticas que garantam esforços de existência das condições mínimas para equilibrar e/ou sanar os receios e as inquietações de todos os envolvidos na atual e adaptada conjuntura de organização escolar. 

Podemos afirmar que a escola é o espaço mais “modificado”, nas mudanças que envolvem as novas rotinas de adaptação, para o retorno às aulas presenciais com todos os estudantes. 

Nesse contexto, é necessário tratarmos dos três aspectos fundamentais que poderão contribuir nesse momento de efetivação das condições essenciais para o bem-estar de todos. São eles:

  • os sentimentos que todos deverão ser ouvidos inicialmente pela necessidade mais recorrente do grupo;
  • o lúdico como caminho de aprendizagem significativa para as mudanças atuais na rotina escolar,
  • e, por fim, desenvolver a prática do autocuidado e do cuidado coletivo nos participantes da comunidade escolar. Vejamos a seguir.

Primeira Semana: foco no sentimento e na fragilidade

Ao iniciarmos o retorno coletivo dos estudantes nas salas, teremos a significativa tarefa de desenvolver nas crianças e nos adultos a capacidade de se colocar no lugar do outro. Desse modo, praticamos a empatia e a construção dos sentimentos de que todos merecem o acolhimento. 

Assim, a escuta atenta como forma de preparação do acolhimento emocional deve se realizar entre a equipe docente e as crianças. Ou seja, a melhor maneira de trazer os alunos e professores de volta à escola também é através do acolhimento criativo. 

Acolher a comunidade escolar, com ações de escuta, para a realização das adaptações pedagógicas a partir da necessidade de todos, é a melhor forma de receber as pessoas utilizando-se da escuta atenta.

Essa escuta atenta deve efetivar-se com registros de palavras-chave que dão elementos para as ações didáticas a trabalho posteriormente.

Atividades para realizar na primeira semana

É importante propor três momentos na semana inicial do retorno às aulas, são eles: o primeiro será com os pais e as crianças nas trocas sobre o que cada qual está sentindo nesse retorno presencial. A produção pode ser por turmas, com murais de socialização dos sentimentos.

Cada pessoa envolvida deve ser estimulada a escrever, desenhar ou colar algo que representa aquilo que sente no momento. Crianças, junto aos pais ou responsáveis, terão que realizar esse registro logo em seguida do momento inicial de reflexão da roda de acolhimento.

Coloque uma música que possa sintonizar o grupo para pensar em si mesmo e no outro, na saudade, na vontade de estar na escola, na necessidade de aprender em diferentes contextos que poderão ser verbalizados com apoio da família. A obra de arte coletiva deve ser nomeada e socializada para as outras turmas da escola.

Nesse momento, o professor terá os registros dos sentimentos para apoiar no seu planejamento e deverá cuidar de cada um e de todos juntos. 

O segundo momento envolve essa mesma dinâmica e será realizada com os professores e gestores. E, por fim, no terceiro momento, cada participante da comunidade escolar terá que representar, de forma individual, um sentimento que deseja ofertar, do que aconteceu de mais importante e que gostaria de socializar com uma pessoa da escola. 

É com produções desse tipo que o professor poderá contribuir para a superação das dificuldades de socialização ou para quem apresentou problemas de adaptação no retorno à escola.

Praticar o lúdico como caminho de aprendizagem significativa

A memória afetiva que temos quando adultos é sempre dos momentos significativos, por chamar atenção, por ser colorido, por ter alguma situação em que se adorava estar. Isso é o que fará o cotidiano da escola ter novo significado com as aulas presenciais. 

Precisamos transformar esses momentos do cotidiano escolar em significativos. Ou seja, nossa orientação é iniciar a prática com o lúdico, envolvendo as informações orientadoras dos cuidados com a Covid-19, espalhando informações em cartazes (ou mesmo em outros formatos, como texto teatral ou texto informativo), por todos os ambientes da escola.

É interessante reservar três situações lúdicas para socializar informações importantes, para esse acolhimento, com a participação das crianças. 

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Podemos exemplificar essas informações lúdicas como o “espaço da amizade”, com imagens das crianças, para que elas possam encontrar os amigos em outros espaços da escola. Nesses espaços, pode-se deixar uma orientação para que a criança realize uma ação lúdica, como dançar a música que mais gosta, entre outras atividades divertidas. 

Uma boa ação também é espalhar, por todos os ambientes da escola, informações coloridas e de fácil visualização, para compor os cuidados que devemos ter para evitar a Covid-19. Essa ação ajudará a contribuir com as mudanças atuais na rotina escolar. 

A adaptação às mudanças de rotina e a organização do retorno com segurança, vinculadas à aprendizagem, irão contribuir com a sistematização do conhecimento e com a participação da família na escola.

Praticar o autocuidado e o cuidado coletivo

Para realizarmos esse acolhimento de forma a contribuir com a continuidade dos estudos, é importante a criança e o adulto pensarem em si e aprenderem a cuidar do que comem e do que fazem para viver. 

Para isso, podem ser propostos circuitos de diferentes situações de autocuidado como:

  • música e dança,
  • artesanato criativo,
  • cuidados com a natureza,

Tudo sendo relacionado ao estudante nessa produção individual para a saúde corporal, mental e coletiva, como forma de contribuir com as relações entre todos. 

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Nessa organização, é necessário que os grupos se desliguem das atividades rotineiras, uma vez por semana, para utilizarem a música nas trocas de experiência, para cuidar de si, experimentando sentimentos, favorecendo as melhores relações com os outros. É extraordinário utilizar o trabalho com a música, de forma semanal, para favorecer essa construção. 

Conclusão

Diante do cenário de pandemia no qual vivemos, é provável que o atendimento a algumas das necessidades, que serão apresentadas no desenvolvimento das ações pedagógicas.

Elas precisam ser compartilhadas nos espaços individuais de escuta, para uma intermediação mais específica com a criança, tornando necessários, em algumas situações, os serviços de atendimento psicológico com o apoio das secretarias de educação nessa organização.

Renata Araújo Jatobá de Oliveira 

Pesquisadora de Pós-doutoramento em Educação pela Universidade de Lisboa (Portugal). Doutora em Ciências da Educação pela Université Lumière Lyon 2 (França). Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE – Brasil). Especialista em Éducation Pédagogique et Culture(s) de l’Altérité pela Université Claude Bernard Lyon 1 (França). Consultora educacional com os Programas Alfagestar (@alfagestar) e Criative-Lar (@criativelar).

Palestrante com atuação no grupo PapoEduca (@papo_educa). Trabalha com formação de professores envolvendo Prática Pedagógica, Alfabetização Sistemática, Heterogeneidade e Gestão do Ensino da Leitura e da Escrita, Consciência Fonológica na Educação Infantil, Didática e Metodologias do Ensino com Aulas Remotas, Educação Híbrida, entre outras temáticas. Pesquisa sobre Educação e Linguagem. Autora de materiais didáticos para Educação Infantil e Ciclo de Alfabetização.