A importância da rede de apoio para professores: como a ajuda mútua fortalece a educação

“Para educar uma criança, é necessária uma aldeia inteira”. O famoso provérbio africano ressoa profundamente no contexto educacional. Ele remete ao entorno que envolve o amadurecimento infantil e ao compartilhamento de responsabilidades coletivas, onde as ações, palavras e gestos de uma comunidade influenciam o ser em crescimento.
Esse conceito, por sua vez, nos leva à ideia de rede de apoio, que está sempre presente na temática de maternidade e paternidade. Trata-se da comunidade formada por um número variável de indivíduos que oferecem suporte a pais e responsáveis, e pode ser composta por familiares, amigos, educadores e outros profissionais.
No entanto, a rede de apoio é inversamente proporcional ao pouco que se fala sobre o suporte que ela própria precisa para oferecer qualidade a pais e filhos. É a velha questão: “quem cuida de quem cuida?” Como os educadores podem ser assistidos para cumprirem sua missão, tanto do ponto de vista pedagógico quanto, principalmente, social?
Saúde mental dos professores: o cenário atual
De acordo com uma pesquisa divulgada em janeiro de 2025 pela Revista Educação, e realizada em 2022, 21,5% dos professores brasileiros avaliaram sua saúde mental como ruim ou muito ruim. Ansiedade (60,1%), cansaço excessivo (48,1%) e problemas de sono (41,1%) foram alguns dos sintomas mais relatados. Desmotivação (55%) e sobrecarga de trabalho (49%) também apareceram na lista.
Diante deste quadro, o foco na saúde mental dos professores no Brasil passou a incluir uma maior fiscalização das empresas por riscos psicossociais, como metas excessivas e sobrecarga de trabalho, por meio da atualização da NR-1. Trata-se da Norma Regulamentadora nº 1, que estabelece as disposições gerais e o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) para a segurança e saúde no trabalho (SST) no Brasil.
Recentemente, a norma foi editada e atualizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (Portaria MTE nº 1.419/2024) para incluir a saúde mental dos professores. Sua vigência foi prorrogada para 26 de maio de 2026. A partir dessa data, as escolas, assim como outras empresas, deverão identificar e mitigar fatores como sobrecarga de trabalho e assédio moral, implementando medidas de prevenção.
Programas de apoio a professores: conheça as iniciativas atuais
Atualmente, existem diversos programas de instituições governamentais que visam oferecer suporte ao meio docente em esferas como a econômica, fiscal, pedagógica e social. São programas federais, estaduais e municipais, incentivos financeiros, condições especiais em bancos (como cartões de crédito sem anuidade e financiamentos), descontos em eventos culturais e hotéis, além de formação continuada.
A nível nacional, há programas como o Mais Professores — que visa atrair jovens para a carreira docente, incluindo bolsas para estudantes universitários de licenciatura e um adicional salarial para professores em áreas de baixa oferta —; a Carteira Nacional Docente do Brasil — documento oficial que garante acesso a vantagens e descontos em eventos culturais e parceiros do governo —; e o Pé-de-Meia Licenciaturas — que oferece bolsas para estudantes de licenciaturas que se destacaram no Enem.
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Dentro das unidades federativas, há iniciativas próprias. Em Minas Gerais, por exemplo, existem os Incentivos Financeiros Pedagógicos, que oferecem valores por dia de atuação em aulas de reforço e oficinas para a recomposição das aprendizagens dos estudantes. Em Pernambuco, destacam-se o programa Ganhe o Mundo (PGM) Professor, que permite o intercâmbio para professores de inglês e espanhol, e o Bônus de Desempenho Educacional (BDE), que premia os servidores e unidades de educação com os melhores resultados.
Há também ações voltadas à segurança dos docentes. O Observatório Nacional da Violência contra Educadores, por exemplo, coleta dados nacionais sobre a violência contra educadores, oferece apoio jurídico e psicológico e ajuda na criação de uma política nacional de proteção para os profissionais da Educação. (Confira em: https://onve.uff.br/)
A rede de apoio entre professores: o poder do apoio mútuo
Pode parecer óbvio, mas muitas vezes a obviedade esconde o que as pessoas não enxergam justamente por estar tão à vista. Para além das válidas iniciativas institucionais, o apoio mútuo entre professores é fundamental, imprescindível e até terapêutico. Ele pode trazer uma série de benefícios, além de proporcionar estofo emocional e pedagógico. Uma rede de apoio forte e efetiva é uma comunidade colaborativa que oferece suporte prático, permitindo que os educadores compartilhem experiências e enfrentem desafios enquanto promovem a inclusão e o bem-estar dos alunos e da própria comunidade escolar.
Benefícios da rede de apoio docente
Recorremos a uma lista para expor alguns dos muitos aspectos positivos de participar em uma rede de apoio docente de apoio mútuo:
- Multidisciplinaridade: A articulação entre a equipe pedagógica deve incluir, além dos professores, orientadores educacionais, a gestão e profissionais de outras especialidades, como assistência social e de saúde. O crescimento das práticas individuais e do grupo, como um todo, fortalece-se com o conhecimento compartilhado.
- Compartilhamento pedagógico: É fato que práticas pedagógicas, quando compartilhadas, tendem a se tornar mais robustas e eficientes. O compartilhamento e o planejamento coletivo de aulas são benéficos para a docência e para os estudantes.
- Inclusão: A educação inclusiva facilita o acesso dos estudantes a tudo que estiver disponível no ambiente escolar e assegura que cada um receba o suporte necessário para o seu pleno desenvolvimento acadêmico e social. Além disso, a inclusão permite a ampliação da discussão sobre estratégias para atender às necessidades específicas de alunos com deficiência, Transtorno do Espectro Autista (TEA) e/ou altas habilidades/superdotação, por exemplo.
- Saúde emocional: Quem lida com a sala de aula sabe bem do estresse e da exaustão que perfazem essa rotina. Diante disso, problemas como tensão constante, ansiedade e até alguns mais graves, como síndrome de burnout e depressão, podem surgir. Por isso, é importante cultivar um ambiente de trabalho mais saudável, onde todos possam se sentir acolhidos e compreendidos.
Quando o “lado ruim” pesa mais
Toda profissão tem sua carga de “dor e delícia”. Professores, além de todos os desafios, pressões e dificuldades rotineiras, ainda acumulam uma grande culpa de responsabilidade. Afinal, ter para si a missão de promover o aprendizado e a formação de crianças, jovens e adultos requer um comprometimento diferenciado. E a responsabilidade excessiva pode vir acompanhada de sentimentos como ansiedade e frustração.
Um docente pode se sentir culpado se um estudante não conseguir desenvolver uma habilidade, por exemplo. Já alguém que busca novas abordagens pode se frustrar caso seu esforço não tenha os resultados planejados. Some-se a isto a ansiedade ocasionada pela grande quantidade de demandas, tanto as voltadas ao cumprimento das metas quanto às relacionadas aos aspectos burocráticos.
Essas situações não são doentias se os sentimentos acontecerem de forma esporádica ou somente a partir de um acontecimento externo incomum. O problema surge quando há acúmulo e intensificação dos sintomas ao longo do tempo, podendo levar a sérios problemas de saúde, como Síndrome de Burnout e depressão.
- Síndrome de Burnout: distúrbio emocional e físico causado por estresse crônico no trabalho, caracterizado por exaustão extrema, desmotivação e sensações de ineficácia e sobrecarga. A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu-a como um fenômeno ligado ao trabalho que se agrava com o tempo devido a longas jornadas, pressão constante, metas inatingíveis e falta de reconhecimento.
- Depressão: transtorno de humor persistente que causa tristeza profunda, perda de interesse e prazer nas atividades, e pode interferir na vida diária, afetando sono, apetite e concentração. As causas são multifatoriais, envolvendo genética, biologia, ambiente e fatores psicológicos.
Apoio como “cura”
Em qualquer das situações relatadas, as redes de apoio são imprescindíveis. É por meio do diálogo (principalmente com colegas que conseguem compreender as angústias e dissabores de forma mais plena) que se compartilham experiências. E o compartilhamento é a base de qualquer tratamento de ordem psicológica. Lidar de forma mais saudável com os problemas pode repercutir diretamente na recuperação da autoestima e na renovação do prazer no ofício.
Composição da rede de apoio
Formar ou fazer parte de uma rede de apoio eficaz não requer grandes esforços ou articulações. Geralmente, elas são constituídas organicamente e a partir da cultura colaborativa de professores, fortalecendo-se espontaneamente nos intervalos de aulas, reuniões, na pausa para o cafezinho ou no encontro do corredor. Laços que acabam se construindo de forma até imprevisível, em alguns casos. Vale lembrar que, além dos colegas de trabalho, mentores e gestores escolares, estes núcleos podem (e deveriam) conter também profissionais de saúde e assistência social.
Dicas para construir/participar
- Socialização: o isolamento não é aliado da construção coletiva. Manter laços com colegas de trabalho por meio do diálogo aberto e colaborativo, seja presencialmente ou por ferramentas digitais, faz toda a diferença.
- Suporte da gestão escolar: além de estimular o trabalho colaborativo entre os profissionais, a gestão pode oferecer tempo para planejamento coletivo, garantir que as ações de apoio estejam previstas no Projeto Político-Pedagógico da escola e atuar como articuladora.
- Aliança com a comunidade: essa aliança pode servir para que os docentes tenham mais conhecimento sobre serviços de assistência social locais (como os oferecidos pelos Centros de Referência Especializados de Assistência Social – Creas), conselhos tutelares, serviços de saúde e outras instituições públicas.
Minibio da autora
Patrícia Monteiro de Santana é jornalista formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) em 2000. Atua em veículos como TV Globo, Revista Veja e Diário de Pernambuco, além de trabalhar com assessoria de comunicação empresarial, cultural e política.
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